Estamos ao redor dos anos de 1950. Toda população de Ernestina e arredores estavam acostumados a conservar as estradas, com os “capatazes” reunindo a população para um dia de trabalho coletivo visando a restauração das picadas, das trilhas e dos carreiros, que muitos chamavam de “estradas”. Na época, eram assim os locais de comunicação utilizados para o transporte da população, através de cavalos, de aranhas e diligências. As mercadorias eram transportadas em carroças puxadas por uma ou mais juntas de bois, conforme o peso da carga. Mas sempre era uma aventura enfrentar uma estrada esburacada pelas chuvas e dos atoleiros oriundos da falta de drenagem.
O mutirão para “fazer a estrada” era uma festa. Desde cedo, havia um vaivém de juntas de bois, de arados e de cavalos trazendo “engenheiros” sem diploma, mas dispostos em pôr a mão na massa e mostrar um serviço qualificado. A ordem de desbarrancar as laterais de cada lado da “rodovia” vinha do capataz de plantão. Os arados arrancavam grossos fardos de terra e as dezenas de enxadas disponíveis se encarregavam de desmanchá-las e distribuí-las ao longo do renovado leito. Os carroções eram a opção mais recomendada para socar a terra mole que vinha dos barrancos. E as crianças se divertiam fazendo peso nas carroças puxadas pelos bois, contribuindo para amassar os torrões, deixando uma rodovia com um trânsito macio.
Mas aí veio a patrola e tudo mudou. Todos festejaram a nova opção para fazer uma estrada com mais rapidez e aparência. Os largos pneus eram o melhor rolo compressor até então imaginável. Agora bastava alguém reclamar na Prefeitura e o serviço ficava agendado. Quando chegava a novidade do “amarelão”, todos corriam para a estrada para ver sua obra. De vez em quando, o morador atento à sua passagem, parava a gigantesca máquina, entabulava uma conversinha com o patroleiro, e tudo se resolvia: fazia a entrada para sua casa, que também estava em precárias condições.
Enquanto a máquina consertava o pátio da casa, o pai chamava as crianças e elas saíam em louca disparada atrás das galinhas. Precisavam “gratificar” este serviço prestado. Às vezes, a caixa reservada na cabine da patrola, para as “ofertas” não oferecia mais espaço e o operador precisava de muita criatividade para transportar as mercadorias. Em outras moradias, já havia reserva de salames, queijo e vinho, para as justas recompensas. Não faltaram desavenças entre famílias, pela coincidência de almoços, jantares ou pouso, oferecidos ao maquinista. Não havia mais horários disponíveis.
Após uma semana de trabalhos, ao retornar até Passo Fundo, os mercados do Boqueirão, já aguardavam o patroleiro, oferecendo a opção de produtos, oriundos da colônia, onde os agricultores honestos, ofereciam produtos “naturais”, sem agrotóxicos, diretamente do produtor ao consumidor.
Foi assim que entrou a corrupção no interior, como algo normal e natural. Depois se tornou “habitual” para toda nossa gente. Tudo começou com a patrola. A culpada ainda hoje é a patrola, que nunca concordou com estradas de asfalto e calçamentos. Ela tem culpa no cartório e ainda não foi julgada.
Legenda: Quando veio a patrola, os capatazes de estrada,
ficaram desempregados