Estamos há mais de um ano em situação de pandemia com
processos de arrefecimento e aumento das contaminações. A única segurança[AAdR1] dada à população é a vacinação. Neste sentido louva-se a
celeridade da ciência que conseguiu produzir vacinas com certa segurança em pouco
tempo. Contudo, ainda enfrentamos
problemas para ampliar o número de pessoas vacinadas. A organização dos
governos para a aquisição e distribuição tem implicância no contingente de
pessoas imunizadas.
Além da capilarização da vacinação, para que se tenha um mínimo de segurança na retomada das atividades nos diferentes segmentos da sociedade, vê-se outros desafios urgentes que discorremos aqui. Chamamos a atenção ao fato de que muitas dificuldades já estavam presentes em nossa realidade, as quais foram agravadas e explicitadas com a pandemia.
Uma primeira análise diz respeito à economia. Esta encontra-se muito fragilizada. A maioria dos setores sofreu grande revês, o que acarretou em falência de empresas e consequentemente a perda de empregos. Muitas pessoas viram-se forçadas a abandonarem seus empregos para cuidarem dos filhos que estavam sem acesso à escola, ou até mesmo reduziram a carga horária de serviço. Isso se tornou inviável e como veremos a seguir tem contribuído para a situação de miséria. É importante salientar que o país já vinha passando por uma crise e a pandemia só aumentou as dificuldades. Diante disso, faz-se necessário uma grande articulação nacional para organizar os setores mais abalado e isto precisa acontecer com responsabilidade, tendo como foco a geração de emprego e renda.
Relacionado à questão econômica vê-se o aumento do percentual de pobres e miseráveis, também em viés de alta antes da crise do Covid 19. No início da pandemia fomos surpreendidos pelo número de pessoas que acessaram o auxílio emergencial. Isto indica que já havia, além dos brasileiros envolvidos com a economia informal, afetados pela diminuição da circulação humana, pessoas sem acesso a uma forma de renda e que foram em busca do auxílio.
Desde 2015 vinha se apontando para o crescimento do número de pobres e miseráveis com o risco de o país voltar ao mapa da fome, que segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), significa cinco por cento da população de um país em situação de extrema miséria. É um retrocesso que se dá pela pandemia, mas também pela irresponsabilidade dos últimos governos federais em tratar a questão da pobreza como problema social de primeira grandeza.
O setor educacional também está em um momento difícil. No ano passado, por ocasião da divulgação do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), setores da sociedade questionavam a sua realização. Justificava-se pela dificuldade de os estudantes das escolas públicas acessarem as aulas oferecidas online devido às dificuldades ao acesso tecnológico, através de aparelhos eletrônicos como celulares e computadores ou até mesmo com a conexão de internet. Este é apenas um elemento do quadro. De forma geral o processo ensino-aprendizagem ficou prejudicado. Professores, alunos e familiares precisaram se reinventar e se adaptar à modalidade de ensino ‘online’, através de plataformas virtuais, aulas com presença virtual. Houve muitas mobilizações de pessoas com maiores condições financeiras através de campanhas para arrecadação desde celulares, computadores, tablets, até mesmo de alimentos para aqueles estudantes de baixa renda. Mas, isso não resolveu o problema e certamente o resultado deste ano de dificuldades e adaptações não será alvissareiro. Todavia, será necessário, assim, como na economia a otimização de esforços na perspectiva de recuperar as lacunas deixadas, sobretudo em relação aos estudantes das escolas públicas que certamente foram os mais afetados.
Também cabe salientar a influência da pandemia no comportamento humano. Tivemos que lidar com o medo e a insegurança. Muitos idosos que tinham uma vida ativa precisaram se resguardar em casa por fazerem parte do grupo de risco. E não estavam preparados para um longo período em casa. Somam-se aos idosos os desempregados, as pessoas que perderam familiares, os que passaram pela contaminação e ficaram com sequelas.
A enfermidade física da sociedade também se tornou enfermidade mental, afetando as relações familiares, a vida religiosa, e outras dimensões estruturantes da vida. Será necessário enfrentar um processo de cura coletiva amplo em vista da reorganização existencial e social. É preciso com força, amor e coragem retomarmos o princípio samaritano de ver, sentir compaixão e cuidar (Lc 10, 25-37). E como nos motivou a Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano, chamando-nos à “fraternidade e diálogo: compromisso de amor”, pois “em Cristo, a vida vence. Ele é a nossa paz”, exercitamos o diálogo a partir do cuidado.
Assim, algumas iniciativas deverão ser adiadas em vista do que é mais urgente, ou seja, socorrer e cuidar os que ficaram caídos no caminho, porque em tudo a vida deve estar em primeiro lugar.
Pe. Ari Antonio dos Reis e Seminarista Marlon de Aguiar