Não podemos nos calar sobre o que
vimos e ouvimos (At 4,20). Esta expressão foi utilizada por dois homens
ameaçados de prisão pelo bem que faziam (At 4, 1-5). Retrata os tempos
posteriores à Ressurreição de Jesus, quando, mesmo com a vida correndo risco,
os discípulos saíram a proclamar a boa nova.
Pedro e João, assim como os demais discípulos foram revestidos de duas grandes forças, mistério para a humanidade, todavia compreensíveis se lidas à luz da fé. Primeiramente a ressurreição de Jesus, testemunhada pelos seguidores e seguidoras, apresentada com diferentes narrativas pelos quatro evangelistas. Em segundo lugar, a vinda do Espírito Santo (Jo 20,22; At 2,1-4), que impulsionou aquelas pessoas saírem do medo e da insegurança e anunciarem o nome de Jesus em todos os lugares, como Ele mesmo havia pedido (Mt 28, 1-20; Mc 16, 15-20; Jo 20, 23s).
Estes fatos aconteceram ligados a uma história, um itinerário iniciado pelo Filho de Maria e José, o galileu.
O caminho percorrido pelo Nazareno foi marcado por momentos de tensão no começo da missão (Lc 4,16-20). A incompatibilidade do projeto do Reino com as estruturas econômicas, sociais e religiosas da época foi se esclarecendo. Os homens convidados ao discipulado foram percebendo as contradições no caminho. Ao darem-se conta das perseguições que se aproximavam, ficaram confusos e inseguros (Jo 14,1-3). Não era o que esperavam (Mt 20,20-21).
Com o aumento das dificuldades, sobretudo na cidade de Jerusalém, sobreveio a traição (Mt 26,14-16) e a negação de qualquer proximidade com o Filho de Deus (Jo 13,38). Após o julgamento, seguido do calvário e morte na cruz, os discípulos se dispersaram (Mc 14,27). Permaneceram firmes o discípulo amado, a mãe de Jesus e algumas mulheres, entre elas Maria Madalena (Jo 19,25-27). Era um fim triste para um homem que cativou multidões. Era algo desalentador para os discípulos, que deixaram tudo para seguir Jesus acreditando na proposta do Reino anunciado (Mc 1,15). Não havia muito o que fazer a não ser retomarem a vida anterior (Jo 21,1-3) tendo o cuidado para não caírem em prisão.
Mas, aconteceu algo totalmente novo e este fato foi celebrado pelas comunidades cristãs na Vigília Pascal. Jesus ressuscitou. Venceu a morte. Cumprira a promessa de derrubar a última barreira para realizar o seu projeto. Em um primeiro momento havia a necessidade de convencer o grupo da Ressurreição. Ajudá-los a dar outro passo. E, aos poucos, Jesus conseguiu a segunda vitória, ajudar o grupo a vê-lo como ressuscitado e retomar o projeto. A promessa se concretizara e ia se fortalecendo paulatinamente com a contribuição dos apóstolos.
Por isso, era necessário saírem e anunciarem o nome de Jesus como Pedro fez: esse homem, segundo o plano previsto por Deus, foi entregue por mão de gente sem lei, e vocês o mataram, crucificando-o. Mas Deus o ressuscitou, libertando-o da habitação dos mortos, em poder da qual não era possível que ficasse preso (At 2,24-24). Disse mais impelido por uma coragem inigualável: Deus ressuscitou esse Jesus. E todos nós somos testemunhas disso (At 2,32). Convida todos à conversão: arrependam-se e cada um de vocês seja batizado em nome de Jesus Cristo para o perdão dos pecados. E vocês receberão o dom do Espírito Santo (At 2,38).
Com a força do Espírito Santo Pedro e os demais seguidores de Jesus deram continuidade à obra missionária. A convicção do testemunho foi gerando o seguimento como descreve o livro dos Atos dos Apóstolos: os que acolheram a palavra de Pedro foram batizados. E nesse dia uniram-se a ele cerca de três mil homens (At 2,41).
As dificuldades não haviam acabado. As perseguições continuavam e até com mais intensidade (At 5,40) e gerando mártires como Estevão (At 7,54-59). A tribulação não arrefeceu o ânimo dos cristãos. Muitos se espalharam, mas sem deixar de anunciar a Palavra (At 11, 19-22). A força do testemunho convicto dos cristãos já passando para a segunda geração foi disseminando a boa nova do Evangelho. Assim se cumpria o mandado deixado pelo Filho de Deus antes de ascender ao céu (Mc 16, 15-20). Os discípulos não hesitaram em falar do que viram e ouviram (At 4,20). Para eles era algo irrenunciável.
Somos hoje fruto desse testemunho. Devemos a nossa fé a essa tradição que foi passando os anos. Nesse tempo de Páscoa não deixemos de falar o que vimos e ouvimos. Devemos esse compromisso aos primeiros cristãos. Estejamos convictos desse necessário testemunho. As gerações futuras nos agradecerão.
Pe. Ari Antonio dos Reis