Finados: a saudade, a memória, a oração

Postado por: Ari Antônio dos Reis

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Na casa de meu Pai há muitas moradas (Jo 14,1).

 

Celebramos no dia 02 de novembro o dia de finados, a memória dos féis defuntos. A tradição de referenciar os entes queridos perpassa todas as culturas e se expressa por diferentes ritos e simbologias. Diz respeito à compreensão de que a morte física não determina o rompimento total das relações estabelecidas entre os seres humanos. Elas assumem um novo patamar segundos os princípios da fé cristã. Parte do princípio de que a morte não é separação definitiva: com efeito, ainda que os mortos, não estejam separados uns dos outros, pois todos percorremos o mesmo caminho e nos encontraremos no mesmo lugar. Jamais estaremos separados, pois vivemos por Cristo, e agora estamos unidos a Cristo indo em sua direção...estaremos todos reunidos em Cristo (CIgC 1690).

 Nos primeiros séculos da caminhada cristã era costume rezar pelos mortos especialmente os perseguidos pelo Império Romano. Vê-se então o simbolismo das catacumbas, locais onde eram sepultados os mortos que passou a ser também o lugar do culto. Ali era o lugar de encontros e oração dos cristãos perseguidos e na oração se incluía a prece pelos mortos.

 Desde então a prática de oração pelos mortos foi se fortalecendo e incorporada à tradição cristã.   A escolha de uma data específica aconteceu a partir do século X quando o superior da abadia de Cluny, na França, Odilon de Cluny determinou que seus coirmãos dedicassem um dia para a oração pelos mortos. O rito orante sustenta a esperança de que possam ascender ao paraíso e serem contados entre os salvos (Ap 7, 16-17). Desde então a  tradição fundada na fé na ressurreição se espalhou pelo mundo todo.   

Na perspectiva humana a memória de finados pode ser compreendida sobre três aspectos, ambos embasados da fé e na esperança da vida eterna, como professamos na oração do creio: “creio na ressurreição da carne e na vida eterna”. São eles, a saudade, a memória e a oração. Os dois primeiros são eminentemente humanos. O terceiro compreende a fé, e esta sustenta a esperança na vida eterna, a crença de que nossa jornada não se encerra na vida presente.

A saudade é própria do ser humano. Diz respeito ao sentimento de perda pelo afastamento de uma pessoa, momentâneo ou prolongado. Sentimos saudade das pessoas que queremos bem pela importância que tiveram em nossas vidas.  A perda de um ente querido afeta o ser humano, porque o desejo é estar sempre junto da pessoa querida. Diante do fato inevitável da morte cabe administrar a saudade sem perder a esperança.

 A lembrança atenua a saudade e impulsiona a continuidade da luta diária, apesar da perda. Também chamamos a lembrança de memória. É o ato de olhar para o passado sem ficar preso a ele, mas como alento para a caminhada que deve continuar. São as informações e os fatos da vida guardados devido a importância para a pessoa e para a sua comunidade.  Através da memória relemos a história buscando aprender com esta história. Mas pela memória também revisitamos nossas relações com os entes queridos. Ela é afetiva e também tem uma dimensão pedagógica.

A oração é muito importante na tradição cristã. É o diferencial daqueles que têm fé e acontece a partir da convicção de que a vida humana não se esgota no plano terreno. A oração remete ao futuro, à eternidade que o Filho de Deus garantiu aos que têm fé. É tradição entre os cristãos, como dito anteriormente, rezar pelos mortos. E a prece significa a continuidade dos laços de afeto que nos unem aos entes queridos que já partiram. Mesmo que exista a distância física não há separação também porque a memória mantém a presença. A prece pelos mortos é descrita na Sagrada Escritura no segundo Livro dos Macabeus 12, 42-45. O texto expressa oração pelos mortos a partir da crença na ressurreição. A oração também é uma obra de misericórdia espiritual recomendada pela tradição cristã.  Acima de tudo a oração pelos mortos é um gesto de comunhão fraterna a partir da fé em Jesus Cristo, o ressuscitado que aponta para o ser humano o mesmo caminho.  

O dia dois de novembro convida à referência saudosa, respeitosa e orante. Sobretudo, convida a renovarmos a fé na vida eterna.

Pe. Ari Antonio dos Reis 

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