O Papa Francisco representa a Igreja dos pobres. Igreja que à riqueza e ao luxo, aos títulos e à pompa, à solenidade e ao ritualismo estéril, dá preferência a uma sincera simplicidade.
Uma igreja que se comunica com o povo e com o mundo não numa linguagem
acadêmica, sofisticada, hermética e desconhecida, mas com gestos, palavras e
parábolas populares e acessíveis ao mais simples dos mortais. Por isso mesmo,
confere novo sabor e novo tempero à Palavra de Deus e à Boa Nova de Jesus
Cristo. A palavra deixa as estantes cheias de pó e se transforma
verdadeiramente em “Evangelho = Boa Notícia”. O Verbo se faz carne viva e
amiga, presença ativa e sadia, olhar e sorriso que penetram e amam, consolam e
reavivam, abençoam e trazem esperança.
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Assim fez o pobre de Assis. Sua pobreza e sua nudez, como as de Jesus de
Nazaré, interpelam as vestimentas bordadas a ouro e prata de tantos sacerdotes,
templos e religiões. Sua acolhida aos leprosos e abandonados, como a do profeta
itinerante do Evangelho, questiona a insistência na construção de fortalezas e
palácios inacessíveis. Sua mensagem lúcida e límpida, vibrante e alegre, como
as imagens do Reino, se revestem de beleza e poesia sem par. Água cristalina
diante da sede crescente de encontro com o outro e com o totalmente Outro.
No momento em que boa parte da Igreja insistia em aliar-se ao poder
temporal, desfrutando de seus benesses, Francisco surge como um pobre servidor,
lembrando o gesto do lava-pés na última ceia, seguido da oração sacerdotal.
Quando trono e altar pareciam dar-se as mãos, através da espada e da cruz,
Francisco canta e louva o Criador na singeleza dos pássaros e das flores, dos
astros e das águas, das árvores e dos frutos, a exemplo do homem de Nazaré.
Contemporâneo de uma Igreja que combate furiosamente os infiéis e os
hereges, Francisco chama a todos e a tudo de irmão e irmã, seguindo o Mestre
que prega o amor aos inimigos. Enquanto os tribunais eclesiásticos acendem
fogueiras para queimar os pecadores e hereges, em boa parte mulheres, o pobre
de Assis lhes vai ao encontro, consciente de que Jesus oferece o perdão a todas
as Marias e Madalenas, Josés, Pedros e Antonios arrependidos. Numa época onde
predominava o obscurantismo, o medo e o pecado, Francisco renova sobre a
sociedade medieval o olhar terno, puro e doce do Filho de Deus.
Tempos difíceis, em que a própria Igreja se envolve em conflitos e
guerras, Francisco se faz instrumento da paz, com os olhos fixos na palavras da
Sagrada Escritura. Quando as trevas do ódio parecem tomar conta dos corações e
das almas, o pobre de Assis se faz poeta e mensageiro da luz do amor. E se
acaso e escuridão e o desespero cobriam a luz do sol e o azul do céu com nuvem
sombria e ameaçadora, Francisco era o porta voz da fé e da esperança renovadas.
Andarilho da palavra e do gesto, nutria os corpos encurvados, os espíritos
abatidos e os corações desesperançados.
Um filho da burguesia nascente que, com ousadia, coragem e profetismo,
deixa a própria casa e os familiares para lançar-se nas pegadas de Jesus, e
consequentemente, no caminho tortuoso dos pobres e excluídos, dos migrantes e
refugiados, dos invisíveis e descartáveis. Ousadia que traz sérias
interrogações a quem, nos dias de atuais e mesmo dentro da Igreja e/ou dos
Institutos e Movimentos Religiosos, segue exatamente o caminho inverso. Coragem
que desafia um retorno às fontes genuinamente evangélicas, numa verdadeira
“fidelidade criativa”, a qual, em lugar de uma mera imitação, busca recriar
diante dos desafios de hoje a Boa Nova do Mestre. Profetismo para resgatar e
reavivar a “opção evangélica pelos pobres” no contexto da economia globalizada
que, a um tempo, concentra e descarta, exclui e mata, produzindo
contemporaneamente riqueza e miséria, ostentação e fome, mansões e casebres.
Autor: Alfredo J. Gonçalves
FONTE: https://www.neipies.com/francisco-francisco/