Na semana que celebramos a memória de São
Joaquim e Sant’Ana é oportuno refletir o papel do idoso na sociedade e nas
famílias. No seu pontificado o Papa Francisco tem reiteradas vezes refletido
sobre as formas de relação com os que chegam à terceira idade. E faz isso como
contraponto a uma tendência social de menosprezar a pessoa idosa ao ponto de
considerá-la descartável. É um fenômeno próprio desse tempo e exige necessidade
de um outro olhar.
Este é
possível pela educação. Educar as
pessoas para a aceitação e convivência com os idosos vendo-os não como um
problema, mas como oportunidade de crescimento pessoal e espiritual. Na Exortação Christus Vivit o Papa
Francisco faz este alerta dialogando com os jovens. Escreveu: tendem por vezes a prestar pouca atenção à memória do
passado donde provêm, especialmente dos inúmeros dons que lhes foram
transmitidos pelos pais, pelos avós, pela bagagem cultural da sociedade onde
vivem. Ajudar os jovens a descobrir a riqueza viva do passado, conservando-a na
memória e valendo-se dela para as suas decisões e possibilidades, é um
verdadeiro ato de amor para com eles, visando o seu crescimento e as opções que
são chamados a realizar (ChV 187).
A
Sagrada Escritura lembra que se a beleza de um jovem está em sua força, a honra
do ancião está em seus cabelos brancos (Pr 20,29). A história vivida por este é
um manancial de aprendizados para as gerações futuras. O apóstolo Paulo, em
carta ao jovem Timóteo, lembra da importância da sua avó na transmissão dos
princípios da fé: recordo a fé sem fingimento que há em você, a mesma antes
havia em sua avó Loide e sua mãe Eunice (2Tm 1,5). O texto bíblico apresenta também
uma orientação de como lidar com os idosos: filho, cuide do seu pai na velhice,
e não abandone enquanto viver. Se ele perder a lucidez, seja compreensivo e não
o desrespeite, enquanto você está com toda a força (Eclo 3,12-13).
Ainda na Exortação
Christus Vivit, o Papa Francisco lembra dessa necessária relação: ao mundo,
nunca foi nem será de proveito a ruptura entre gerações. São cantos de sereia
dum futuro sem raízes, sem arraigamento. É a mentira que deseja fazer-te crer
que só o novo é bom e belo. A existência das relações intergeracionais supõe
que, nas comunidades, se possua uma memória coletiva, pois cada geração retoma
os ensinamentos de quantos a antecederam, deixando assim uma herança aos seus
sucessores. Isto constitui quadros de referência para alicerçar solidamente uma
sociedade nova. (ChV 191).
Os povos africanos deixam um legado significativo
nesse sentido. Uma boa referência quanto
à compreensão do papel dos idosos no ciclo da vida. A cultura africana coloca
as novas gerações como devedoras dos antepassados. Tudo o que a pessoa é,
deve-se aos familiares que quiseram que ela existisse. O ser humano hodierno é
fruto das gerações anteriores e a elas deve reverência e respeito, jamais
desprezo ou rompimento. Compreende que
existe uma história familiar a ser respeitada e preservada, pois sustenta os do
tempo presente.
Os idosos também podem contribuir de forma
decisiva para o enfrentamento da cultura do imediatismo e do presentismo, que
significa considerar como valor único o “agora”, muitas vezes, ilusória e
repleta de frustrações. Começa pela atitude de compreender-se idoso com
serenidade. É necessário assimilar o
tempo que passa não como inimigo, mas como um processo natural de todo o ser
humano. O texto de Eclesiastes diz que debaixo do céu há um tempo para cada
coisa (Ecl 3,1). Chegou o tempo da vida idosa. Não é melhor ou pior que os
outros. É o tempo próprio de quem já percorreu um bom caminho, usufruindo a
graça da vida. Então, jamais maldizer porque “ficou velho” mas agradecer porque
chegou a esta etapa da vida. Urge também aprender a lidar com as fragilidades
físicas com paciência e sentido de cuidado pessoal. Existem atividades e
processos que não são próprios de uma pessoa idosa. Não vale a pena ir contra a
natureza sob o risco de frustração e sofrimento. Acolher com sabedoria as
marcas do tempo implica também em acolher as limitações que o tempo tem legado.
O Senhor vem ter conosco com uma palavra
benigna, que convida a acolher o mistério da vida com serenidade e paciência,
deixando a Ele o juízo e não vivendo de lamúrias e remorsos (Papa Francisco).
A sociedade e as famílias também têm um papel importante diante da
realidade da velhice. É equívoco romantizar a velhice, pois tira as pessoas do
chão da vida. A velhice é uma realidade no horizonte de todo o ser humano.
Alcançá-la é graça. Acolhê-la com sabedoria é virtude construída ao longo da
história de vida. Cabe enfrentar a convivência com idosos com realismo
evangélico, acolhendo com sobriedade as consequências de tal convivência
naquilo que existe de bom e bonito e também nas falhas e fragilidades. Não suceda que, à força de correr a toda a velocidade
atrás dos mitos da eficiência e da produção, nos tornemos incapazes de abrandar
para acompanhar quem sente dificuldade em aguentar o passo. Por favor,
misturemo-nos, cresçamos juntos, dizia o Papa Francisco.
Que São Joaquim e Sant’Ana
inspirem os idosos compreenderem e se alegrarem por esta fase da vida e as
gerações jovens a acolherem e caminharem com os idosos, às vezes, os segurando
e outras vezes se apoiando neles.
Pe. Ari Antonio dos Reis