Estamos na caminhada jubilar enquanto “peregrinos de esperança” provocados a acolher e promover esta que é acento de fé de todos os cristãos. A liturgia deste 27º Domingo Comum do ano jubilar propõe a reflexão a partir do Evangelho de Lucas 17,1-5. A perícope é componente de um texto mais amplo, a narrativa da viagem de Jesus a Jerusalém (Lc 9,51-19,27).
Lucas escreve o Evangelho respondendo às dúvidas das comunidades cristãs que já não estavam conseguindo responder aos desafios da proposta evangelizadora. Ele tinha um carinho muito grande por estas comunidades. Seus membros eram todos amigos de Deus (Teo-filos) e precisavam compreender aqueles momentos difíceis e assumi-los sob a luz da fé e do projeto de Jesus. Diante das dificuldades missionárias caberia manter a fé e continuar servindo ao Reino, superar os diferentes desafios propostos pela prática cristã. As comunidades cristãs são motivadas por Lucas a ler seu caminhar à luz da peregrinação de Jesus e seus companheiros de jornada, aqueles convocados a estarem juntos no anúncio do Reino como compromisso de fé, os mesmos chamados a serem pescadores de homens (cf. Lc 5,11).
O trecho narrado por Lucas descreve um caminhar marcado por diferentes desafios para o Mestre de Nazaré e para os seus discípulos. O grupo percebe que a ida a cidade santa não significaria o encontro com o poder, prestígio ou uma vida fácil, mas o enfrentamento das forças que geravam dor e sofrimento na vida do povo.
Jesus era a boa-notícia e anunciou esta disponibilidade a partir do seu projeto missionário (Lc 4,16-20). Na cidade de Cafarnaum, onde ensinava e curava muitas pessoas explicitou em palavras e gestos o que faria pela humanidade (Lc 4,31-41). Também percorria a Galileia pregando e curando a muitos como parte da missão delegada pelo Pai. Convocou alguns homens que, provocados pela força da sua Palavra, deixaram tudo e se fizeram seus discípulos o acompanhando na peregrinação missionária. Deixaram o trabalho da pesca, como atividade de sobrevivência, para serem pescadores de homens (Lc 5,1-11). Foi um caminho de muitos aprendizados para estes homens e certamente marcado por tensões e conflitos, porque foi revelando grandes descobertas, como também a necessidade de conversão daquele grupo (Lc 9,4-48).
O pedido feito a Jesus e com o qual inicia o Evangelho deste domingo brotou de uma inquietação do grupo de seguidores, que Lucas denomina apóstolos, confirmando a migração do discipulado. Teriam responsabilidades maiores. O pedido é aparentemente muito simples e direto: aumenta a nossa fé (Lc 17,5). Por que o pedido? Podemos ver em duas perspectivas. A primeira diz respeito à superação da experiência da tradição judaica a qual o grupo ainda estava ligado, mas que não respondia aos desafios que encontravam no caminho. Aquela peregrinação rumo a Jerusalém estava abrindo os olhos e o coração do discipulado. Era um amadurecimento necessário. Deveriam aderir de forma definitiva àquela nova proposta que se descortinava na pessoa de Jesus, uma transição semelhante à que aconteceu com a oração. Quando pediram a Jesus que os ensinasse a rezar buscavam uma nova forma de experiência orante, alternativa à que estavam acostumados e liam como superada a partir do contato com Jesus. Fato semelhante aconteceu com a experiência de fé.
A segunda perspectiva implica na adesão às consequências do seguimento de Jesus, o discipulado que se faz apostolado com as responsabilidades aumentadas. Os apóstolos viam a necessidade de algo mais denso e consistente que lhes permitisse continuar aquele percurso com Jesus e para o qual se sentiam frágeis. Deveriam ser fiéis e leais àquela proposta. Sentiram-se provocados pelo contraponto que Jesus representava para eles. Nele a fortaleza e convicção, enquanto no grupo uma certa tibieza e temor. Por isso o pedido aumenta a nossa fé. Expressa a vontade de ter as mesmas condições de Jesus para fazer aquela peregrinação. Revela também uma vontade humana, um amadurecimento diante dum horizonte que surge e que precisa ser assumido.
Jesus respondeu ao grupo sugerindo a adesão total à proposta sem reservas. Aqui surge a contraposição quantidade/qualidade. Quem mergulha em Jesus o faz integralmente e totalmente o que ainda era difícil para aquele grupo. É a entrega sem reservas que permite peregrinar com Jesus. É a força vital que permite avançar, pequena como um grão de mostarda, todavia, com uma grande força transformadora. Esta fé era necessária ao grupo dos seguidores de Jesus.
A segunda parte do texto (Lc 17,7-10) apresenta as consequências da fé. Esta tem poder transformador e também faz do cristão um servidor. Acontece a partir de uma motivação interior, indiferente a uma recompensa externa. É ato de pura gratuidade. Lucas, ao projetar esta parte no texto, assinala para as comunidades a gratuidade da obra evangelizadora. É um ato amoroso e gratuito e, portanto, exercido na liberdade. Somente a fé permite tal atitude.
Nesse sentido a fé é uma graça e um mistério no qual a pessoa vai mergulhando e ao mesmo tempo encontrando Deus que chama à experiência de estar com ele. Não foge ou ignora os desafios do mundo, mas acolhe-os como consequências da fé que amadurece.
A pessoa que canta “creio Senhor, mas aumentai minha fé” o faz no sentido de que Ele lhe dê a coragem de assumir as consequências dessa fé que se desdobra no tempo e no espaço, como peregrino de esperança, e tem como uma das suas dimensões o serviço gratuito aos irmãos.
Pe. Ari Antonio dos Reis