O grande rio gabava-se de suas praias, de seus peixes e da reserva de poder energético armazenada em seu volume de água. Todos o admiravam, porque não transbordava, fornecia água limpa para a irrigação, possuía dragagem excelente, e bom calado para as embarcações em seus portos fluviais.
Quando o índice de poluição de suas águas aumentava, logo colocava a culpa em seus afluentes.
– São invejosos – dizia – pois não aceitam a minha natural grandeza e meu poder invencível.
– Não é isso – retrucavam seus fornecedores de água. – Ele não reconhece nosso trabalho. Ele nos humilha demais e nos culpa de todos os males. Para ele, somos apenas córregos, riachos, regatos, ribeiros, sangas, arroios e assim por diante. Somos nós que fornecemos a água que o torna grande e volumoso. Os peixes vêm desovar em nossas águas e depois os devolvemos a ele. Quando uma seca o ameaça, a culpa é das cabeceiras que não fornecem água. Vamos tomar uma decisão em conjunto.
O grande rio, que se julgava autossuficiente e invencível, começou a preocupar-se com a posição que seus afluentes iriam tomar, junto às autoridades. A decisão, que lhe foi comunicada, deixou-o arrasado:
– O Ministério das Minas e Energia decidiu construir uma grande usina elétrica no grande rio. Para tanto, necessita de uma enorme reserva de água, que alagará toda a sua bacia. Já foi determinada a medição da área necessária, para fins de desapropriação e indenização. Com a construção da barragem, o grande rio vai transformar-se num grande alagado.
A festa dos afluentes foi muito grande. Agora todos juntos formariam uma imensa reserva de água, de muito valor para a usina. Não haverá mais queixas, pois todos terão os mesmos direitos e deveres.
Atrás dos grandes, há sempre muitos pequenos que os sustentam. Dificilmente reconhecem essa realidade. Mas, quando os oprimidos descobrem a força da solidariedade e se organizam, resgatam seus direitos e contribuem para uma socialização maior dos bens.