Repercutimos,
neste espaço, uma instigante reflexão feita pelo professor Marciano Pereira
sobre quais aprendizagens podemos fazer a partir da pedagogia de Jesus. Este
texto reflete como os professores e professoras podem inspirar as suas práticas
educativas, tomando por exemplo os gestos, os métodos e a linguagem do Mestre
Jesus Cristo.
Segue
a reflexão, que também está publicada no site www.neipies.com
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“A
palavra pedagogia tem origem na Grécia, deriva de paidós que significa criança
e agodé que se traduz por direção, deste modo cabe ao pedagogo e à
pedagoga caminhar com o educando possibilitando aprendizagens. É tarefa desse profissional
ajudar o estudante a vislumbrar direções, a extrair sentidos do seu existir no
e com o mundo.
Dentre
as muitas opções pedagógicas, este breve ensaio se propõe a iniciar uma
reflexão sobre a pedagogia de Jesus, tal como se encontra em Lucas capítulo
vinte e quatro, versículos de treze a trinta e cinco, trata-se de uma pedagogia
na qual o ensino e aprendizagem ocorrem no caminho, a exemplo do que já faziam
os peripatéticos antes de cristo.
Da
etimologia grega do termo pedagogia se desdobra uma concepção bem desafiadora
para o fazer educativo que se realiza nos espaços escolares e fora deles, isto
porque a existência humana acontece em um mundo com diversas opções de
caminhos, alguns íngremes, barrentos, espinhosos demais para serem trilhados
sem que a dignidade seja estilhaçada.
Dentre
os muitos caminhos que se apresentam à nossa vista, se encontra a opção por uma
educação calcada nos valores do neoliberalismo, na formação de mão de obra
barata para um mercado de trabalho que deseja espezinhar, escravizar ao invés
de oportunizar renda e condições para que a vida seja humana; outras opções
metodológicas fundadas em visões autoritárias fortalecem a violência e
desmobilizam a cultura da paz.
Essas
constatações e críticas são temas de conversas, de pesquisas, de buscas que
enquanto humanidade fazemos. Também andamos como aqueles dois discípulos de
Emaús, cabisbaixos a caminho de nossas casas, de nossos locais de trabalho,
especialmente quando se trata dos espaços onde a educação ocorre, ali onde a
vida deveria ser tematizada e fluir na alegria da descoberta, reinam práticas,
por vezes autoritárias, violentas, desprovidas da intenção humanizadora.
O clima é de
desesperança e de tristeza diante do mercado que vende uma falsa ideia de
felicidade, diante de concepções e métodos distorcidos que não educam para a
liberdade e autonomia.
Cléofas
e o outro discípulo, (sem nome, porque figura cada um de nós) são, para fins dessa
reflexão, professores, educadores, gestores, pessoas que perderam a referência
do Mestre, que deixaram de acreditar e apostar na força transformadora do seu
fazer.
O
caminho de Emaús acontece aqui, onde o sistema sufoca a vida, onde as políticas
educacionais são pensadas desde um poder que se serve ao invés de servir. Neste
cenário caótico que se insere a pedagogia da pergunta, recurso filosófico que
serve para desestabilizar, colocar em crise as certezas e dar à luz a
estratégias que reascendam a esperança.
“O
que vocês andam conversando pelo caminho?”, é a pergunta do Mestre aos discípulos
de ontem e de hoje, e como dito acima o tema da conversa é a esperança que se
perdeu, havia tanta potência naqueles estudos que realizávamos, naqueles grupos
de pesquisa que frequentávamos, porém os tempos mudaram e a liquidez da vida tapa nossos olhos para o essencial
do fazer pedagógico, para a fé no ser humano e na transcendência, o amor –
caridade que se traduz em ações geradoras de vida, a esperança do verbo
esperançar como arguia o pedagogo e filosofo Paulo Freire.
O objetivo da
pergunta de Jesus é provocar a reflexão dos seus discípulos para que se lembrem
do essencial, da palavra das escrituras e dos fatos que fazem arder o coração.
No
caso dos profissionais da educação é preciso recordar as teorias que
fundamentam a prática e superar a dicotomia entre uma e outra, como argumenta
Freire “é fundamental diminuir a distância entre o que se diz
e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua
prática” (FREIRE, 2003, p. 61).
Um
educador freiriano e discípulo de Jesus precisa buscar através da sua práxis coerência
para que seu fazer nunca perca de vista a humanidade e não sirva a outras
pedagogias que favoreçam o mercado alimentando o sistema neoliberal.
É urgente apostar
cada vez mais num fazer pedagógico inclusivo e dialógico, reunir-se com os
pares e partilhar as angústias enfrentadas no caminho é condição para formar comunidade
educativa.
É
preciso como fez Jesus com aqueles discípulos recordar as razões da fé, os
motivos da escolha pela docência e os compromissos assumidos nas relações de
ensino aprendizagem. Para tanto, é necessário que a educação seja concebida
como processo no qual todos se humanizam, é sempre ponto de partida que não se
conclui com o encerramento de uma etapa, de um ciclo.
Por
vezes, somos lentos demais para perceber que o fazer pedagógico, embora nem
sempre se realize nas condições ideais, faz
grande diferença na vida das pessoas.
É
pela educação que se pode romper ciclos de vulnerabilidade, de violência e de
injustiça. É na escuta atenta da palavra, na aprendizagem de conteúdo
específicos que se pode desenvolver habilidades provocadoras da mudança. É
preciso prestar atenção nos sinais e dar ouvido ao que parece absurdo, ou seja,
as pessoas que anunciam a possibilidade do novo, que nutrem grandes esperanças,
e por vezes, são desacreditadas devido ao pessimismo e ou descrença daqueles que
o sistema conseguiu dominar.
Ao
chegar no destino, pequeno povoado de Emaús, aquele homem, até então
estrangeiro, fez menção de seguir adiante, porém foi convidado à ficar, porque
já era tarde. Foi então que os olhos dos dois se abriram quando sentados à mesa
Jesus abençoou e partiu o pão, nesse momento eles entenderam porque durante a
caminhada, processo de aprendizagem muito usado pelo evangelista Lucas, os
corações deles ardiam.
O momento da
partilha do pão aqui é figura da vida partilhada entre docentes e discentes,
das reuniões pedagógicas onde a experiência dos colegas pode iluminar as
diferentes práticas possibilitando esperançar. Sentar-se à mesa, quando se trata
de educação, significa alimentar-se dos fundamentos que movem as ações
pedagógicas, e festejar as conquistas que ocorrem durante a caminhada.
Um
educador cristão não é um apologista e ou
doutrinador, pelo contrário é um ser humano que, por convicção, entende as
implicâncias éticas do seu agir e assume, assim como Jesus, a árdua missão, de
questionar, provocar e mobilizar esforços em prol da vida, inclusive quando
entende as consequências de remar contra a maré de um sistema inumano desde as
suas origens. Sistema que impede a festa da páscoa sempre que provoca a fome, a
miséria e as situações de não vida.
Um
educador cristão sempre será um discípulo que opta pelo diálogo, pela pedagogia
da pergunta se importando e se colocando a serviço da vida. Quando os profissionais da educação entendem
a grandiosidade da tarefa que realizam, eles não ficam parados resmungando,
murmurando contra o sistema, eles se mobilizam para construir sentido e
elaborar significados diferentes dos ditados pela pedagogia neoliberal.
Educadores
que não perdem de vista os motivos principais do fazer que realizam partilham
vivências, elaboram e efetivam planos que corroboram com a formação integral de
sujeitos. Essas atitudes figuram o corajoso retorno à Jerusalém, outrora lugar
da derrota. Era noite, mas o medo foi vencido, visto que notícia feliz não pode
ser guardada, precisa ser partilhada e dar sentido a existência de outras
pessoas, fomentar outras práticas geradoras de vida.
Que
cada instituição se constitua nesse lugar de encontro e da partilha que gera a
vida”.
Autor:
Marciano Pereira
REFERENCIAS:
BÍBLIA
DE JERUSALEM. Bíblia sagrada. Paulus –
2008 (Lc 24, 13- 35).
FREIRE,
Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 27ª ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2003.
FONTE:
https://www.neipies.com/aprender-com-a-pedagogia-de-jesus/