Era para ser apenas um Trabalho de Conclusão de Curso, um daqueles projetos que nascem entre livros, orientações e muitas madrugadas de escrita. Mas para Alexandre Vieira, biólogo formado pela Universidade de Passo Fundo (UPF), o TCC se tornou algo muito maior. O que começou como uma pesquisa sobre plantas para telhados verdes hoje virou o EcoLar: uma casa ecológica, feita com garrafas de vidro, construída com as próprias mãos e com a ajuda da comunidade.
A trajetória de Alexandre é daquelas que mostram como a Universidade pode ultrapassar os limites da sala de aula. A conexão com a professora Cláudia Petry foi o primeiro passo dessa história. Durante a graduação, em 2011, ele procurava um tema que unisse ciência, meio ambiente e um ideal de vida sustentável. Foi nesse momento que conheceu Cláudia, que já carregava um histórico de projetos em agroecologia e sustentabilidade.
Um encontro que mudou trajetórias
Alexandre conheceu a professora Cláudia Petry quase por acaso. Ela, referência nos estudos sobre sustentabilidade e educação ambiental, era orientadora de doutorado de uma das professoras de Alexandre, Carla Tedesco, outra grande inspiração em sua formação acadêmica.
“Foi através da professora Carla que nos aproximamos. Logo nas primeiras conversas com a Cláudia, já começamos a discutir arquitetura sustentável, telhados verdes e técnicas de bioarquitetura”, lembra Alexandre. Aquela afinidade de pensamentos virou parceria. Da teoria para a prática, o aluno inquieto encontrou na professora a mentora que precisava.
Cláudia, por sua vez, enxergou no jovem estudante o potencial para transformar ideias em ações concretas. “A orientação com ela foi o start de tudo. Os questionamentos que ela me fazia me tiravam da zona de conforto. Acho que sem essa orientação, nada do que construí hoje existiria”, conta ele, com gratidão.
Quando o TCC vira realidade
A ideia do EcoLar surgiu entre as páginas de uma monografia. Durante três semestres, Alexandre mergulhou no estudo de plantas com potencial para serem utilizadas em telhados verdes. A pesquisa acadêmica virou inspiração para algo maior. “O EcoLar é, de certa forma, a minha monografia colocada em prática. Desde o início, eu queria que meu trabalho tivesse uma aplicação real. Não fazia sentido escrever sobre sustentabilidade e não viver isso na prática”, explica.
Mas a motivação principal para o projeto veio de um dado incômodo: enquanto 98% das latas de alumínio são recicladas no Brasil, 98% das garrafas de vidro são simplesmente descartadas. “Aquilo me incomodava muito. Então decidi que queria construir minha casa reutilizando esse material que muitas vezes vai parar em aterros”, diz.
Sustentabilidade que se constrói com as próprias mãos
Mais do que um conceito acadêmico, o EcoLar se tornou um verdadeiro canteiro de experiências. Com a ajuda da comunidade, de amigos e de curiosos que se encantam com o projeto, Alexandre ergueu as paredes da sua casa garrafa por garrafa. Hoje, as paredes coloridas e translúcidas dão ao espaço uma estética única: mistura de arte, ciência e militância ambiental.
As práticas sustentáveis dentro do espaço não param por aí. Com apoio de estudantes da UPF e de grupos ligados à educação agroecológica, o EcoLar tem sido palco de ações de plantio, educação ambiental e até mesmo de pequenos reflorestamentos. Recentemente, uma mini horta urbana foi criada com o apoio de alunos e visitantes.
“É complexo colocar as pessoas para trabalhar diretamente na construção, por questões de segurança, mas a ideia é que em breve, em novos espaços como o EcoLab, os estudantes possam participar mais ativamente da construção das paredes e de outras etapas do projeto”, projeta Alexandre.
A educação ambiental que transforma
Se construir o EcoLar foi um desafio físico e emocional, o impacto educacional do projeto é ainda maior. Escolas, universidades e grupos comunitários visitam o espaço para entender como o reaproveitamento de materiais pode, de fato, transformar realidades.
Para Alexandre, esse contato direto é essencial. “As pessoas precisam ver para acreditar. Quando elas entram aqui e percebem que é possível morar de forma sustentável, a transformação acontece”, afirma.
Durante as visitas, temas como reciclagem, redução de resíduos e reflorestamento são debatidos. Tudo de forma prática e acessível, para que a educação ambiental deixe de ser só teoria.“Existe um estigma de que quem fala de meio ambiente é eco-chato, porque a gente insiste nos R’s da sustentabilidade: reduzir, reutilizar, reciclar… Mas são atitudes básicas que, se aplicadas no dia a dia, podem ter um impacto gigantesco”, defende.
Uma parceria que extrapolou o ambiente acadêmico
Ao relembrar os momentos de orientação com a professora Cláudia, Alexandre não esconde a emoção. A relação entre os dois foi mais do que uma simples orientação acadêmica. Foi uma troca de experiências, um empurrão constante para sair do óbvio.
“Com a Cláudia, nunca teve essa de horário marcado. A gente trocava ideia a qualquer momento. As conversas eram dinâmicas, diretas e sempre muito desafiadoras. Ela me fez olhar para o mundo com outros olhos”, resume.
Hoje, o EcoLar não é apenas a materialização de um TCC. É como a relação entre aluno e professor pode ir além da Universidade e gerar impactos sociais e ambientais concretos.
Para Cláudia, ver o projeto ganhando vida também é motivo de orgulho. A semente plantada em sala de aula germinou em forma de paredes verdes, hortas urbanas e centenas de garrafas reutilizadas que agora abrigam um sonho.
O futuro: expandir o EcoLar e plantar mais árvores
Alexandre já pensa nos próximos passos. Com o espaço quase finalizado, ele sonha em criar o EcoLab, um segundo ambiente, dedicado exclusivamente à educação ambiental prática. Lá, a ideia é envolver ainda mais estudantes, escolas e comunidade em atividades de construção, plantio e reflorestamento.
“Num mundo cada vez mais afetado pela crise climática, a melhor ação que podemos tomar é plantar árvores. Onde for possível, o máximo possível. Essa é uma urgência que todos nós precisamos assumir”, conclui.
Enquanto fala, Alexandre segura firme o copo de silicone que carrega para todos os lados. Um pequeno gesto que traduz a filosofia que guia sua vida: menos resíduos, mais consciência e ação.
O EcoLar é prova de que um TCC pode sim sair do papel. E mais do que isso: pode virar uma casa, uma causa e, principalmente, uma inspiração.