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O professor refém

Repercutimos nesta nesta coluna, instigante reflexão proposta
por professor
e pesquisador do
Mestrado e Doutorado em Educação da UPF, Altair Fávero, publicada no site
www.neipies.com

 

Para Fávero, “quem vive e convive com o cotidiano da
escola sabe o quanto essa condição de refém é prejudicial à saúde e ao bem
estar do professor. Não se faz educação de qualidade sem que o professor tenha
condições dignas de exercer seu trabalho”.

 

Segue texto na íntegra:

 

“Em
tempos de crise na educação, de ataque às escolas, de aulas remotas, de
obscurantismo tomando conta das redes sociais, dos discursos de ódio contra
pessoas que pensam diferente, na eminência de um novo surto de doenças consideradas
extintas, a identidade e importância do professor se faz sentir com toda força intensidade.

O
professor é um sujeito social milenar que precisa ser compreendido dentro dos
diversos tempos e espaços que ocupa. Não há dúvida de sua importância histórica,
de seu papel na consolidação de uma sociedade democrática e de sua relevância
na formação das novas gerações.

A
experiência traumática da pandemia vivida recentemente, reacendeu um debate
fundamental sobre o papel do professor nos dias atuais. Pais que defendiam
educação domiciliar ou homeschooling para ficar numa expressão
americanizada, entusiastas da Educação à Distância, pessoas e que aplaudiram propostas de
políticos que almejam transformar tudo em educação a distância, com a recente
experiência da pandemia se sentem retraídos, desconfortáveis e se dão conta que
a escola presencial e o professor são imprescindíveis.

Retomei
recentemente a leitura do livro O
professor refém
(Editora Record, 2006),
da filósofa e educadora carioca Tania Zagury. Trata-se da publicação de uma importante
pesquisa realizada por Zagury com
1.172 professores de educação básica em escolas públicas e privadas de todo o
país. Dentre as perguntas de pesquisa exploradas por Zagury destacam-se as
seguintes: o que pensam os professores que atuam com nossos filhos na salas de
aula? Quais são suas maiores dificuldades? Como veem a educação que os pais dão
hoje às crianças? Que avaliação fazem das recentes mudanças educacionais?

[foto=107499]

A pauta desenvolvida por Zagury no livro não é
pequena – progressão automática, (in) disciplina, dificuldades em sala de aula,
temas transversais, avaliação, recuperação paralela, condições de trabalho -,
enfim, todos os elementos que habitam – e muitas vezes atormentam – o cotidiano
dos professores.  Os professores que
tiverem a possibilidade de ler a pesquisa sistematizada no livro irão
reconhecer sua própria vida na maior parte das respostas compiladas pela
pesquisadora.

Mas
afinal, de quem o professor hoje é refém?

De forma resumida, a partir da pesquisa realizada,
Tânia Zagury responde: refém da má qualidade de ensino que ele mesmo teve;
refém do tempo que necessita, mas de que não dispõe; refém das pressões
internas que sofre do sistema; refém da própria consciência, que lhe revela sua
impotência; refém dos alunos, que o enfrentam em muitos casos; refém da
família, que perdeu a autoridade sobre os filhos; refém da sociedade, que
surpreende professores e gestores com medidas cautelares, mandados de segurança
e processos …

Apesar
de ser uma pesquisa realizada há quase vinte anos, sua atualidade salta aos
olhos.

Gostaria de acrescentar alguns itens à lista compilada
por Zagury: o professor é refém de um salário cada vem mais reduzido que o
obriga a uma sobrecarga de trabalho para garantir sua subsistência; refém da
cegueira de certos políticos que tratam a educação como prioridade apenas no
palanque eleitoral, mas que esquecem da educação no dia seguinte das eleições;
é refém de certos pais ignorantes que veem a escola como a creche gratuita que
cuida de seus filhos durante boa parte da semana e principalmente agora em
tempos de pandemia; refém da falta de esperança para projetar um futuro melhor
de autorealização profissional; refém de uma sociedade consumista que acredita
que a função da escola é instrumentalizar pessoas para o trabalho e preparar cidadãos
para serem consumistas alienados.

Para quem vive e convive com o cotidiano da
escola sabe o quanto essa condição de refém é prejudicial à saúde e ao bem
estar do professor. Não se faz educação de qualidade sem que o professor tenha
condições dignas de exercer seu trabalho.

A
condição de refém faz com que o professor se torne vítima do medo, da
insegurança, da frustração, da falta de perspectivas.

Pesquisas mostram que nossos professores estão
adoecendo, que nossos jovens não querem ser professores e que o futuro
educacional está ameaçado. Se é correto o dito popular de que “a grandeza de
uma nação se mede para qualidade da educação do seu povo”, então teremos muito
a lamentar num futuro próximo se continuarmos mantendo nossos professores
reféns”.

FONTE: https://www.neipies.com/o-professor-refem/

Autor: Altair Alberto Fávero
altairfavero@gmail.com

Professor
e pesquisador do Mestrado e Doutorado em Educação da UPF

 

 

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