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Oração: encontro com a misericórdia de Deus

Pe. Ari Antonio dos Reis

Neste 30º Domingo do Tempo Comum a comunidade cristã é convidada a refletir a sua peregrinação de fé na relação com o Criador, especificamente como vai sendo construída a partir da oração e também como esta experiência representa a fé tornada prática no cotidiano. Em várias passagens dos Evangelhos Jesus orienta o discipulado sobre a oração fato que revela a sua importância: o Mestre testemunha o jeito de rezar; dedica muito tempo da sua vida missionária à oração e ensina ao grupo sobre como rezar; admoesta o grupo a não ter medo de pedir ao Pai em oração. Como fio condutor da prática de oração está a relação com o Pai, uma relação marcada pela fé como Ele mesmo diz quando existe uma necessidade, pedi e recebereis (Mt 7,7), ou mostra em louvor ao Pai: eu te louvo Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelastes aos pequenininhos (Mt 11,25).

O Cardeal Carlo Maria Martini, arcebispo de Milão, escrevia que a oração é algo muito simples, que nasce da boca e do coração. É a resposta imediata que nasce do íntimo do nosso ser no momento em que nos colocamos frente à realidade da nossa existência e diante do criador. Nessa simplicidade mergulhamos na profundidade da nossa condição humana e no mistério de Deus. Entretanto, é preciso a disponibilidade para isso.

Então, neste momento rezamos a nossa vida, nossos projetos, também nossos pecados, assim como fez o publicano, um dos personagens do Evangelho desse domingo. Também rezamos a vida das pessoas que amamos e rezamos por aqueles que pedem uma prece.  Verdadeiramente é na oração que se tem a oportunidade de ser o que se é sem máscaras ou subterfúgios, porque Deus sabe o que somos e do que precisamos. Justamente, nestes momentos de intimidade com o Pai surge o risco dos equívocos: apresentar-se diante de Deus envolto em mentira e falsidade, como se desconectado da vida real e perpetuando-se na situação de rompimento com Deus, porque o momento não se faz de aproximação, mas de distanciamento maior. Faz-se da oração um mero rito, sem vida ou sem mística.

A oração diante de Deus tem a pretensão da conversão, de fazer da pessoa melhor aos olhos do irmão e de Deus mesmo. Cabe sempre aproveitar estas oportunidades. Por isso, ela parte da vida e visa transformar as relações estabelecidas no cotidiano em sinais do Reino anunciado por Jesus.

A liturgia deste domingo apresenta dois horizontes da vida de oração. Assim a primeira leitura, do Livro do Eclesiástico (Eclo 35,15b-17.20-22a) convida a olhar para o Criador, o destinatário da prece. O texto começa apresentando o Senhor como um justo juiz que não faz discriminação de pessoas. Ele abre os ouvidos ao clamor dos oprimidos e à súplica dos pobres, da viúva e do órfão, os mais vulneráveis da sociedade. Assim deve ser também a conduta dos tementes a Deus. Agir como age o Senhor.  Diante dessa condição o autor sugere que a oração, ligada ao que é ofertado, deve estar conectada ao ciclo da vida, a uma conduta condizente com a justiça divina.  Não pode ser um caminho de cooptação da graça divina, mas a consequência de uma vida honesta, caridosa e atenciosa aos necessitados: “quem serve a Deus como ele o quer, será bem a acolhido e suas súplicas subirão até as nuvens” (Eclo 35,20).

No Evangelho, Lucas convida a olhar a pessoa que se coloca em oração. Jesus, em peregrinação para Jerusalém, contou a história de dois homens que subiram ao templo para rezar. Ele começou a parábola contando a história para “alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam os outros” (Lc 18,19), ou seja, era uma condição de isolamento dos semelhantes e até mesmo de Deus.

Transparece no texto que Jesus tinha alguns interlocutores bem específicos ao contar esta parábola, possivelmente os fariseus. Também expressa o seu objetivo de desmascarar uma compreensão equivocada de religião, assentada em alguns que se compreendiam bons, justos e salvos e desprezavam os demais.

Os personagens da parábola expressam dois modos de ser, simbolizados na oração dirigida a Deus. O fariseu apresentou a Deus o que fazia, segundo os preceitos da lei mosaica (tradição judaica) e isto para era ele grande mérito, ao ponto de se ver como superior aos outros. O publicano, por sua vez, não tinha nada a oferecer a Deus senão sua miséria e seus pecados. Por isso, agarra-se à misericórdia de Deus, porque esta lhe bastava para continuar vivendo. Quer que Deus lhe dê o suficiente para continuar vivendo.  O caminho da humildade o faz chegar ao coração de Deus e continuar vivendo sobre a graça de Deus.

Segundo Jesus Cristo, a prece do publicano foi justificada porque brotou de um coração humilde, diferente da prece do fariseu. Na vida do publicano, mesmo marcada pelo pecado, que ele mesmo reconhece, havia ainda lugar para Deus agir. O fariseu, como via tudo perfeito em sua pessoa e no seu agir, não deixou este espaço para Deus atuar, porque se considerava salvo.

Façamos da oração um momento de encontro com Deus a partir da nossa trajetória de vida, mas deixemos que ele possa agir em nós segundo a sua justiça.

 

Pe. Ari Antonio dos Reis

 

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