Grupo Planalto de comunicação

Passo Fundo deve se assumir uma “Cidade Educadora”?

Nei Alberto Pies, professor, escritor e editor do site.

Repercutimos, nesta coluna semanal, ensaio publicado no dia 20/07/2024 no site www.neipies.com. Este ensaio levanta proposições e questionamentos ao modo como vem sendo implantada a ideia de cidade educadora em nossa cidade, mas seu objetivo maior é que mais pessoas entendam, compreendam e queiram também fazer de Passo Fundo um lugar onde a educação seja a mola propulsora de nossa cidadania e de nosso pertencimento.

Sabemos que são grandes os desafios dos gestores municipais quando aderem à “Carta de princípios das Cidades Educadoras”, movimento que nasceu em Barcelona, com a intenção de promover maiores e melhores condições de viver e conviver nas cidades.

Esta proposta implica uma metodologia, uma abordagem, uma prática de gestão que considere o protagonismo e o reconhecimento dos diferentes sujeitos sociais que fazem parte da cidade. Não é, em definitivo, um título, uma logomarca ou um projeto com fim em si mesmo, mas uma prática política que procura fomentar a participação social, o espírito de coletividade e a responsabilidade de todos e todas no processo de educação. A Cidade Educadora não é um projeto de governo, mas um conjunto de políticas públicas e metodologias com vistas a transformação do território em espaço educativo.

O embrião do movimento “Cidades Educadoras” foi originalmente lançado em Barcelona, em novembro de 1990, no I Congresso das Cidades Educadoras. As cidades presentes pactuaram a luta em prol de um objetivo: trabalhar juntas em projetos e atividades para melhorar a qualidade de vida dos habitantes.

O documento norteador para as cidades que fazem parte do projeto, a “Carta das Cidades Educadoras”, foi lançado nesse mesmo Congresso e contou como principais referências: a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), a Declaração Mundial da Educação para Todos (1990) e a Declaração Universal sobre Diversidade Cultural (2001). Dentre os princípios da Carta, destacam-se:

  • Trabalhar a escola como espaço comunitário;
  • Trabalhar a cidade como grande espaço educador;
  • Aprender na cidade, com a cidade e com as pessoas;
  • Valorizar o aprendizado vivencial;
  • Priorizar a formação de valores.

Nossa cidade, Passo Fundo, fez adesão à “Carta de princípios das Cidades Educadoras” no ano de 2021, quando a Câmara de Vereadores de Passo Fundo aprovou, em 19 de abril, o Projeto de Lei nº 18/2021, de autoria do Executivo Municipal, que autorizou a adesão do Município à Carta das Cidades Educadoras e o ingresso na Associação Internacional das Cidades Educadoras (AICE).

Deste período para cá, muitas questões têm sido levantadas e problematizadas em nossa cidade, a partir do que se anuncia como Cidade Educadora.

Os professores e professoras municipais, por exemplo, ainda não vislumbram, com clareza, qual é o seu papel numa Cidade Educadora? Como uma Cidade Educadora não valoriza mais seus professores e professoras? Por outro lado, organizações sociais e populares que atuam em pautas de cidadania e de direitos humanos na cidade reclamam que não foram ouvidas nem convidadas para discutir e apropriar-se desta ideia da Cidade Educadora, que não deve restringir-se às ações, iniciativas ou programas governamentais.

A não valorização dos professores e a ausência das organizações sociais e populares nesse debate fere um dos princípios da Carta das Cidades Educadoras, qual seja, a prática da cidadania democrática, a ser pautada pelo respeito, pela tolerância, pela participação, pela responsabilidade e interesse pela coisa pública e todos os seus projetos, serviços, bens ou programas.

Registramos, na sequência, esforços coletivos que vem sendo feitos por pessoas e por organizações sociais nos últimos anos, almejando que Passo Fundo realmente seja uma Cidade Educadora. Agora, neste momento histórico e de realização da eleição municipal, estes esforços deveriam abranger o conjunto da sociedade e das organizações interessadas no assunto.

Conhecemos, em 2022, através do Congresso Municipal do CMP Sindicato, com o tema: Cidade educadora: o que temos a ver com isso”?, a experiência de uma cidade que, antes da nossa, já vivencia e pratica a ideia de uma cidade educadora.

Adria Brum de Azambuja, secretária de educação da cidade gaúcha de Soledade, ao ser questionada sobre o que é essencial para que uma cidade vivencie as intencionalidades e os princípios da Carta acima referida, responde:

“uma Cidade Educadora não se limita a vivenciar os recursos pedagógicos somente nas escolas, mas se estende como agente educativo por todo seu território e a todos os seus cidadãos, é uma cidade que se relaciona com todo seu potencial estético, ambiental, de comunicação e criação, mediante o diálogo intersetorial com e para a cidade”.

E acrescenta:

“pensar a cidade na perspectiva educadora supera a ideia de mais um projeto coletivo ou uma temática participativa, mas configura-se numa intencionalidade política que demanda ações planejadas e articuladas a partir do processo educativo. Não é algo dado, não está pronto, não é tarefa fácil nem uma tarefa individual”.

Leia mais: https://www.neipies.com/cidade-educadora-e-pedagogias-dialogicas-e-humanizadoras/

Márcio Taschetto, professor universitário, entusiasta e estudioso do tema Cidades educadoras, em convite para I Encontro sobre Cidades Educadoras e Inteligentes: desafios dos municípios do século XXI, em Passo Fundo, 13 e 14 de setembro de 2017, assim escreveu: “na Cidade Educadora e Inteligente,
a escola é parte essencial do processo educativo e
assume o território como campo de pesquisa, currículo e lugar de estudo.
Aberta à comunidade, ela envolve locais e se reconhece no território,
atuando em prol de suas transformações”.

Leia mais: https://www.neipies.com/por-uma-cidade-educadora-e-inteligente/

Tiago Machado, em publicação neste site, também refletiu sobre o tema afirmando que “cidade Educadora não é, de longe, uma ação específica da Secretaria Municipal de Educação, os professores/as e as suas escolas, a partir das respectivas comunidades escolares, podem fazer importantes ligações e interfaces com as demandas e as necessidades das comunidades locais. A escola pode se tornar um centro irradiador de estudos, de articulações e de realização de atividades que reúnam os diferentes sujeitos sociais das comunidades. Os professores e professoras de uma Cidade Educadora precisam ser valorizados, reconhecidos e convidamos para serem também os protagonistas da mudança das realidades, a partir dos territórios que circundam as comunidades escolares”.

Leia mais: https://www.neipies.com/por-onde-passa-o-futuro-das-cidades-educadoras/

A partir das reflexões suscitadas, depreende-se que uma cidade será Cidade Educadora quando a mesma for compreendida e, principalmente, vivenciada como território educativo. O elemento humano, nesse cenário, desempenha papel fundamental, eis que sem ele não há cidade nem tampouco Cidade Educadora. Antes de qualquer coisa, para que a Cidade seja Educadora há necessidade de humanizá-la. É o humano que nos torna iguais e nos confere o sentido de pertencimento à cidade e ao território.

Como cidadãos desta cidade que adotamos e amamos tanto, sugerimos que, em 2024, durante o processo eleitoral, a cidade de Passo Fundo confronte-se com as ideias e propósitos de uma Cidade Educadora sustentada nos princípios de sua Carta (https://www.edcities.org/pt/carta-das-cidades-educadoras/ ). Que se levantem questões sobre o que ainda precisamos fazer para que Cidade Educadora não fique apenas em anúncios, viagens de intercâmbio ou ações e iniciativas governamentais como a implantação de Escolas Públicas (de Música, de Trânsito, Escola das Profissões, …). Que se abram espaços para a participação popular onde se discuta sobre a cidade que queremos, sobre projetos e ações públicas que efetivamente melhorem a qualidade de vida de nossos habitantes.

Que, ao renovar nosso amor pela cidade, exerçamos dever cívico de construí-la inclusiva, com participação social, com reconhecimento de todos os sujeitos sociais, indistintamente. Que a educação seja promotora de mudanças necessárias para que Passo Fundo seja um lugar bom de viver, de sonhar e de realizar dignidade humana, cidadania e felicidade. Que sejamos, de fato e de direito, uma Cidade Educadora a partir de nossa participação cidadã individual e coletiva, a partir das categorias do protagonismo e do reconhecimento.

Educadora é a cidade que articula, reconhece e promove todas as formas de educar, como também os atores sociais que fazem parte destas. Não exclui escolas do processo de educação global, mas considera as mesmas referências irradiadoras e aglutinadoras de cultura, arte e educação popular, a partir das comunidades onde estão inseridas.

Passo Fundo deve se assumir uma “Cidade Educadora”?

FONTE: https://www.neipies.com/passo-fundo-deve-se-assumir-uma-cidade-educadora/

Nei Alberto Pies, professor, escritor e editor do site.

 

 

 

Facebook
Twitter
WhatsApp