No 13º Domingo Comum a comunidade cristã é iluminada pelo Evangelho de Lucas que relata o envio dos “outros” setenta e dois discípulos em missão aonde ele próprio deveria ir (cf. Lc 10,12.17-20). Lucas é o único evangelista que apresenta o envio dos setenta e dois. Nisso difere-se dos demais evangelistas sinóticos, Mateus e Marcos. Aliás, são duas distinções importantes no Evangelho de Lucas, no que diz respeito ao discipulado de Jesus, a saber, a presença de mulheres discípulas (Lc 8,1-3) e a presença dos setenta e dois enviados em missão, como descreve o texto de hoje.
No caso dos setenta e dois dá-se a explicação de que Lucas tem presente a abrangência dos povos e nações, aos quais deveria chegar o evangelho, além da etnia judaica, as nações pagãs. Então a missão é de todos aqueles que conhecem e aderem a Jesus e querem que outros, na sua liberdade, façam o mesmo processo. Cada um dos setenta e dois seria o representante de um desses povos, assumindo o compromisso missionário. São enviados dois a dois porque devem agir de forma organizada. São enviados por Jesus para serem sinais e testemunhos de esperança. Não iam por conta própria, iam em nome de Jesus.
Uma segunda dimensão do texto diz respeito ao envio. Vejamos que o grupo possivelmente estava com Jesus, vivendo a condição de discípulo. Discípulo é aquele que está junto na condição e disposição de aprender com o Mestre. O ensinamento de Jesus se amplia para além do grupo dos doze. O ensinamento direciona-se aos setenta e dois e também para as mulheres discípulas. Consequentemente, o comprometimento e responsabilidade também. Todo o aprendizado sugere uma responsabilidade.
E Jesus os convida a um passo a mais, o apostolado, pôr a mão na massa, fazer algo pelo Reino. Faz isso diante de uma constatação, fruto da sua peregrinação no meio daquela gente sofrida: a messe é grande e são poucos os operários (Lc 10,2). Ou seja, havia muito trabalho a ser feito. E não havia gente disponível para tanto. Precisava de colaboradores fiéis.
Antes faz entender que a missão não é plenamente humana. Ela tem raiz divina porque Deus convoca pessoas para a sua obra. Disse Jesus: pedi ao dono da messe que envie trabalhadores para a sua colheita (Lc 10,2). Recordemos que escreveu Francisco na Exortação Evangelii Gaudium: a iniciativa é divina; o primado sempre é de Deus (cf. EG 12). Por hora, os deveriam ir contribuindo, cada um fazendo a sua parte, como aqueles setenta e dois enviados. Seriam portadores da esperança para quem os acolhesse. Aquela peregrinação seria muito importante.
Em seguida, Jesus sugeriu algumas recomendações. A primeira delas: não seria um trabalho fácil. Seriam enviados como ovelhas para o meio de lobos. Lucas faz questão de escrever esta expressão em alusão ás dificuldades do caminho, da missão. Jesus não os ilude com promessas fáceis. Teriam dificuldades, problemas. É honesto com o grupo. Alerta quanto às dificuldades externas. Convida-os a olhar o caminho que seria percorrido e as suas armadilhas e dificuldades. Era o caminho a ser percorrido, por onde deveriam peregrinar.
Depois, o alerta volta-se para os missionários enviados. Diz respeito às condições para assumirem o compromisso do anúncio. O olhar para fora deveria ser completado com o olhar interno, pessoal. Diz respeito às condições para exercitar a missão. Jesus chama atenção para alguns requisitos que os setenta e dois deveriam considerar com grande atenção: não leveis bolsa, nem sacola, nem sandálias, e não cumprimenteis ninguém pelo caminho (Lc 10,4). O grupo não iria para uma festa ou piquenique. Iriam trabalhar. Deveria exercitar o serviço plenamente despojados para que nada truncasse ou retardasse a missão. Não deveriam preocupar-se com coisas ou situações que não eram importantes.
Eles foram enviados. Deveriam estar atentos para o que deveriam fazer. Tudo isto em vista de um objetivo explicitado por Jesus: “quando entrardes em uma cidade e fordes bem recebidos, comei do que vos servirem, curai os doentes que nela houver e dizei ao povo, o Reino de Deus está próximo de vocês” (Lc 10,8). Era a concretização do envio dos discípulos para levar a esperança às pessoas que os recebessem. Também fazer o que Jesus já estava fazendo com carinho e misericórdia.
Por fim, lembramos que a missão tem uma finalidade escatológica. A esperança não está amarrada no que é terreno. Ela nos leva a olhar para os céus. E a finalidade escatológica está dividida em algumas situações. Primeiro: os que receberam os setenta e dois, a acolhida dos discípulos missionários era acolhida de um sinal do Reino que se expressou no bem feito, dar alimento e no bem recebido, cura e expulsão dos demônios. Era um sinal do Reino, esperança viva e concretizada. Segundo: a rejeição ao grupo enviado era o sinal da condenação. O Reino estava próximo e foi rejeitado (Lc 10,11). Seriam tratados com grande severidade e rigor. Terceiro: a finalidade da missão que também se volta para o grupo. A capacidade de assumirem a missão e a realização pessoal naquele compromisso, expressa na alegria quando voltaram (Lc 10,17), o que permitiu que seus nomes fossem escritos no céu (Lc 10,20).
A atitude daqueles setenta e dois teve a provocação de Jesus. Mas eles foram protagonistas daquele peregrinar missionário. Foram porque quiseram. E saíram para levar a esperança àquelas cidades e casas, segundo o pedido do Mestre. Mas, certamente o peregrinar foi também de aprendizagem. Voltaram justificados e enriquecidos porque fizeram algo de bom e significativo. Foi a continuidade do discipulado sem a presença de Jesus.
Pe. Ari Antonio dos Reis