Na medida que Jesus avança nos ensinamentos, os apóstolos vão percebendo o quanto era envolvente a missão que tinham aceito. Percebem claramente suas limitações e fazem um pedido: “Aumenta a nossa fé!” ( Habacuc 1,2-3;2,2-4, Salmo94, 2 Timóteo 1,6-8.13-14, Lucas 17,5-10). A fé para um cristão pode dizer tudo, mas também existe a triste possibilidade de dizer nada. Também é verdade que o “todo” está presente em cada parte. Os textos bíblicos da liturgia dominical nos abrem algumas janelas para contemplarmos o amplo tema da fé cristã.
Habacuc questiona Deus que “parece” ausente na vida sofrida do povo. Deus lhe responde que a fé é o único caminho para compreender o mistério da história. A resposta não é fácil consolação, mas convite a espera longa e perseverante: “o justo viverá por sua fé”. Importa ficar ancorado só em Deus, crer no seu amor, no seu projeto mesmo que as aparências sejam contrárias. Deixar-se conduzir por Deus é a certeza que não haverá decepção, é o que atesta a história da salvação.
Na parábola Jesus ressalta que crer é superar a religião economicista e a meritocracia. O serviço dedicado do servo está no centro da parábola. O fiel em confronto com Deus escolhe um comportamento de total disponibilidade, sem cálculos ou contratos. O homem deve doar-se a ele com amor. O envolvimento com Deus é uma relação de amor e não calculado. A alegria vem da doação alegre e serena, amar e se sacrificar por Deus superando a lógica econômica, ou simplesmente do direito e do dever. É a imagem dos pais que amam os filhos de forma espontânea e sem cálculos ou vantagens que vão receber. O evangelho é um convite para a superação da prática religiosa vivida com hábito, tradição, conveniência, medo da morte, para chegar a doação alegre a Deus e ao próximo.
Na Carta a Timóteo São Paulo recomenda: “Usa um compêndio das palavras sadias que de mim ouviste em matéria de fé e de amor em Cristo Jesus. Guarda o precioso depósito, com a ajuda do Espírito Santo que habita em nós”. Crer é aceitar os ensinamentos de fé, isto é, a doutrina transmitida pela Igreja revelada por Deus durante a história. O símbolo da fé ou creio apresenta uma síntese das verdades fundamentais da fé cristã. Estas precisam ser guardadas com zelo diante da ilusão das ideologias, simplificações devocionais, magias rituais, misticismos, teorias sociológicas.
Crer é trabalhar com empenho e humildade pelo Reino. A fé se manifesta no desejo de transmitir aos outros o que foi recebido gratuitamente. Paulo anima Timóteo: “Não te envergonhes do testemunho de Nosso Senhor nem de mim, seu prisioneiro, mas sofre comigo pelo Evangelho, fortificado pelo poder de Deus”. A vivência da fé, o testemunho de fé acontece na rotina da vida marcada por contradições, conflitos, ideias divergentes. É um trabalho que requer testemunho corajoso.
Na Bíblia temos duas séries de vocábulos para indicar o que chamamos de fé: a primeira, indica ser atendido, ser fiel e, efetivamente, o confiar-se, abandonar-se; a outra séria, indica sentir-se seguro, ter apoio sólido. Uma acentua o que a fé exige: abandono; a outra, o que a fé dá: segurança e apoio. São como que duas faces da mesma realidade que se completam mutuamente e juntas constituem a grande virtude teologal da fé. A fé sempre se relaciona com a caridade, enquanto leva ama a Deus e ao próximo. A fé se aquece com a esperança, porque é o fundamento das coisas que se esperam.
O pedido sincero e humilde dos apóstolos deve fazer parte das nossas orações. A fé é escolha humana, mas é sobretudo um dom de Deus. Aprendemos a crer nos colocando de joelhos. Também dizemos: Creio, Senhor, mas aumenta a minha fé. Dá-me a graça de crer; dá-me um coração crente.
Dom Rodolfo Luís Weber – Arcebispo de Passo Fundo